Paleobotânica

Flora do Mesozoico

Recuperação após a grande devastação da fauna e flora do Permiano

O período Triássico é visto, sob o ponto de vista da Paleobotânica, como uma fase de recuperação da flora global após a crise biológica do final do Permiano. Nessa era, o grande continente de Pangeia ainda se estendia de polo a polo sob temperaturas ambientais ainda muito altas. Esta fase da história das plantas terrestres é marcada pela perda da Flora de Glossopteris e de outros grupos de plantas. Contudo, o Triássico traz ainda mais modernização à flora com o surgimento e diversificação de novos grupos de samambaias e de plantas com sementes (espermatófitas). As samambaias começam a se parecer mais com os grupos modernos, especialmente os das regiões tropicais.

Entre as novidades do Triássico, especialmente em Gondwana, está o grupo denominado de Corytospermales, no qual se insere o conhecido Dicroidium, um elemento arbóreo que chegava a atingir 30 metros de altura. Acredita-se que este táxon rapidamente se expandiu após ocupar o gigantesco nicho deixado pela extinção da Flora de Glossopteris. Alguns paleobotânicos acreditam que Dicroidium tem seu ancestral nas Pterodespermales, as samambaias com sementes, uma vez que também apresenta morfologia externa semelhante às samambaias e anatomia interna com caracteres evolutivos ligados às gimnospermas. Os depósitos de carvão do Brasil têm em sua composição restos de Dicroidium, portanto de idade triássica.

Plantas e insetos

A evolução das plantas terrestres e a dos insetos tem estado intimamente associada desde o Devoniano, mas durante o Mesozoico várias ordens de insetos, especialmente as moscas e os besouros, se diversificaram rapidamente. Acredita-se que no Jurássico, os insetos já estavam envolvidos na transferência de pólen de uma planta a outra, fato que possivelmente gerou um potencial para novas especializações.

Cycas– Cycadales

Outra grande novidade na flora do Triássico de Gondwana é o grupo das Cycas, pertencentes às gimnospermas (plantas com sementes nuas) e aparentadas com gimnospermas modernas como as coníferas. Observe que o jardim interno do Instituto de Geociências contém vários exemplares de Cycas revoluta, nativa do Havaí, assim como de outras espécies de Cycas, introduzidas no Brasil como ornamentais. Suas folhas têm aparência de folhas de palmeiras, que são angiospermas. Nos meses de verão pode-se ver a produção de cones masculinos (produtores de pólen) e cones femininos (produtores de óvulos e sementes) em plantas diferentes (plantas dióicas = plantas masculinas e femininas).

Cycadeoides é um grupo de gimnospermas relacionados às Cycas. A classificação atual desse importante grupo de plantas do Mesozoico reúne em Cycadophyta duas ordens: Cycadales e Benettitales. A primeira inclui ambos membros viventes e fósseis, enquanto que Benettitales inclui duas famílias extintas no final do Cretáceao: Cycadeoidaceae e Williamsoniaceae, que eram restritas a Laurásia, sem representantes em Gondwana. De forma geral, as Cycadeoides são reconhecidos como troncos petrificados mais arredondados enquanto que em Williamsoniaceae eles são mais cilíndricos e mais altos.

Evolução das gimnospermas

As coníferas mais antigas do Permiano são substituídas no Triássico por um grupo chamado de Voltziales, que mostra as próximas etapas na evolução dos cones, que agora começam a ficar mais compactos, em preparação para a grande diversificação nesse grupo que ocorrerá no Cretáceo. Entre as novidades estão as famílias Pinaceae, Araucariaceae, Cupressaceae, Taxodiaceae (família da Sequoia) entre outras. Por isso o Cretáceo é visto como um período de modernização das gimnospermas, que resultou nos grupos atuais, na sua maioria restritos às regiões mais frias do hemisfério Norte. Uma exceção a esse padrão são as famílias gondwanicas Araucariaceae e Podocarpaceae, atualmente restritas na sua grande maioria ao hemisfério sul.

Anéis de crescimento

São assim chamados os anéis concêntricos de crescimento anual, formados de células de xilema secundário, especialmente em árvores do hemisfério norte, onde o crescimento é interrompido nos meses de inverno. Eles podem ocorrer em espécies das regiões tropicais onde a época seca limita o crescimento da árvore. Na flora brasileira já foram identificados cerca de 10 táxons com anéis de crescimento comprovadamente anuais. Os anéis de crescimentos são facilmente reconhecidos em táxons de gimnospermas e podem ser facilmente reconhecidos em troncos permineralizados. Os anéis de crescimento têm suas dimensões controladas pela rapidez do crescimento das árvores durante as estações, de forma que quanto mais rápido for o crescimento mais largos serão os anéis. Da mesma forma, anos mais secos geralmente produzem anéis mais estreitos. Essa informação tem grande aplicação em estudos paleoclimáticos através da Dendrocronologia.

Gingko

Florestas de Gingko se espalharam por Pangeia durante o Triássico e iniciam seu declínio no final do Cretáceo. Hoje, esse táxon é endêmico da China. Temos em um dos jardins internos do IGc/USP uma árvore de Gingko biloba, que perde suas folhas no inverno e uma grande árvore dessa espécie pode ser vista no Jardim Botânico de São Paulo. Este fóssil é rapidamente reconhecido pela morfologia típica de suas folhas com formato de leque. O Gingko é um dos melhores exemplos do que chamamos de “fóssil-vivo” em todo o Reino Vegetal.

Welwitschia

Este é um dos fósseis vegetais mais emblemáticos do Mesozoico. Welwitschia é um gênero de gimnospermas altamente especializado que cresce atualmente no deserto da Namíbia e em outras áreas desérticas da África. Seu caule curto sustenta apenas duas longas folhas alongadas com nervuras distintamente paralelas. A mesma planta produz cones masculinos e femininos. O pólen de Welwitschia, morfologicamente parecido com o de Ephedra, uma gimnosperma arbustiva que também floresceu no Mesozoico, é um importante fóssil-guia para o Cretáceo do Brasil em estudos bioestratigráficos. Estudos sugerem que esses dois gêneros se divergiram no final do Cretáceo.

Evolução das Angiospermas

As conhecidas “plantas com flor” apareceram na Terra no início do Cretáceo, embora alguns paleobotânicos acreditem que elas já viviam no Jurássico e que por falta de condições ideais acabaram não preservadas no Registro Fóssil. Antes do final do Cretáceo inicial, os três grupos predominantes de angiospermas (eumagnolíideas, monocotiledôneas, eudicotiledoneas) já estavam estabelecidos. Ainda resta à Paleobotânica elucidar a origem das angiospermas, um assunto que desde os tempos de Darwin é permeado de controvérsias. Para o criador da Teoria da Evolução, a origem das plantas com flores é um “mistério abominável”. Apesar do grandes avanços na Paleobotância, o enigma ainda continua. Nas últimas décadas o debate sobre o grupo ancestral das angiospermas tem dado atenção às samambaias com sementes (especialmente as Caytoniales), membros das gimnospermas como Gnetales, Cycadales e até as Glossopteridades.

Folhas de angiospermas x gimnospermas

Um dos estudos mais importantes sobre a evolução das angiospermas é o de Hickey & Doyle (1977) que examinaram o registro paleobotânico, principalmente folhas e grãos de pólen do Grupo Potomac, Cretáceo dos EUA. Os autores notaram que a evolução das angiospermas é caracterizada nas folhas por um aumento da complexidade da venação em folhas que passaram de simples para compostas enquanto que os grãos de pólen aumentaram gradualmente a número de aberturas, que se tornaram mais complexas, para saída do tubo polínico (Fig. 13. 4).

Fig. 13.4. Tendências evolutivas no pólen e folhas do Grupo Potomac (Cretáceo) da América do Norte (Hickey & Doyle, 1977).

Copiado integralmente com a autorização dos autores:

Anelli, L.E.; Leme, J.M.; Oliveira, P.E.; Fairchild, T,R. 2020. Paleontologia. Guia de aulas práticas, uma introdução ao estudo dos fósseis. Universidade de São Paulo, Instituto de Geociências, 8a ed., 104p.

*Todos os direitos do textos e figuras são reservados aos autores

Rolar para cima