Geologia do Campus da Cidade Universitária

Uma antiga cadeia de montanhas

O Campus da Cidade Universitária Armando Salles de Oliveira (CUASO) tem como substrato cristalino ou embasamento mais profundo, gnaisses, que são produto da deformação de granitos de aproximadamente 600 milhões de anos (Ma), cortados por conjuntos de falhas (rupturas com deslocamento de blocos de rocha). Esses granitos foram formados em profundidades de pelo menos 20 km abaixo da superfície, e são produtos da denominada orogenia Mantiqueira. Orogenia é o termo utilizado para descrever o processo de formação de cadeia de montanhas. A orogenia Mantiqueira formou uma cadeia de montanhas nos moldes das altas montanhas que podemos observar hoje no Himalaia. A antiga cadeia de montanhas da Mantiqueira foi produto da tectônica de placas (movimentação da camada terrestre mais externa, denominado de litosfera), que culminou na colagem de fragmentos litosféricos que deram origem ao paleocontinente Gondwana durante o Neoproterozoico (entre 1 bilhão de anos e 541 Ma atrás). A colagem de placas tectônicas é um evento lento, já que as mesmas se movimentam apenas 5 a 10 cm por ano. No entanto a força desse evento provoca a fusão e deformação das rochas que compõem a placa, tendo como produtos os granitos e gnaisses, respectivamente. 

A ruptura de uma Supercontinente

A ruptura do paleocontinente Gondwana, há cerca de 180 Ma, resultou na separação das placas tectônicas da América do Sul e da África, dando origem aos atuais continentes de mesmo nome. Essa separação provocou falhamentos do substrato cristalino. No Paleógeno, há  cerca de 66 Ma, a reativação desses falhamentos ajudaram a configurar grande parte do atual curso das bacias hidrográficas e dos principais rios do estado, que esculpem o cristalino seguindo as linhas de ruptura. Com o passar do tempo, processos de soerguimento (movimentos que trazem rochas das profundidades para a superfície), associados ao intemperismo (dissolução e quebra das rochas) e a erosão (coleta e transporte de fragmentos de rocha), visando o equilíbrio isostático (equilíbrio gravitacional), fizeram com que os granitos deformados do substrato cristalino emergissem até a superfície, dando continuidade ao ciclo das rochas. No campus, a porção exposta dessa rocha está bastante alterada, em parte já transformada em solo (camada mais superficial, substrato da vegetação); apenas alguns poucos blocos resistiram à ação da água e do tempo, ou seja, à ação do intemperismo. É importante lembrar que a rocha abaixo da superfície foi pouco afetada pelo intemperismo, guardando características originais de sua formação, a qual é denominada de rocha fresca ou sã. Blocos desses granitos deformados são observados apenas na porção sul do campus (próximo ao HU e ao Departamento de Engenharia Química), que é a área mais elevada. 

Afloramento de gnaisse do embasamento cristalino encontrado próximo do Hospital Universitário (HU-USP).

Bacia sedimentar de São Paulo

Os granitos deformados formam a base da denominada Bacia Sedimentar de São Paulo na área do campus. Bacias representam áreas geográficas com subsidência e consequente preenchimento por sedimentos. A bacia de São Paulo foi formada por reativações de antigos falhamentos do substrato cristalino. Essas reativações provocaram movimentos verticais entre blocos, que resultaram em depressões, originando bacias sedimentares, entre elas a Bacia de São Paulo. Os sedimentos dessa bacia cobrem uma grande área da superfície da região metropolitana da cidade de São Paulo. Essa bacia começou a ser preenchida com sedimentos (argila, silte e areia) há  cerca de 30-20 Ma, transportados por rios, e depositados em planícies ou lagos muito antigos, há muito tempo apagados da paisagem. Os sedimentos depositados formaram camadas espessas adensadas que passaram por processo de compactação e consolidação, se transformando em rochas sedimentares, num processo denominado de diagênese. Essas rochas recobriram a superfície exposta do substrato cristalino. Nas diferentes camadas dessas rochas estão registradas as variações climáticas da região. Com o passar do tempo, essas rochas sedimentares, a exemplo do granito, também foram expostas à superfície. Assim, devido ao intemperismo perderam parte da sua memória diagenética, e se transformaram em solo. Grande parte da área do campus faz parte da planície de inundação original do rio Pinheiros (área sujeita a fluxo episódico de água), que tinha caráter meandrante antes da retificação do rio. A retificação do rio foi necessária para a construção da marginal. Os sedimentos mais recentes, de idade quaternária (2,5 Ma atrás até o presente), dessa planície de inundação, recobrem parte das rochas graníticas e sedimentares mais antigas do campus, em especial na região da raia, reitoria e crusp. O quaternário representa o mesmo período do registro dos humanos modernos.

Nossos rios e córregos

O sistema hídrico natural superficial do campus conta com pelo menos duas nascentes (olhos d’água), uma no Instituto de Física e outra no interior da reserva florestal da Biociências, cujas águas vão se depositar no pequeno lago em frente ao Instituto de Geociências, represado artificialmente durante a construção do campus, e que conta com sistema de controle de volume de água. A reserva florestal da Biociências contribui para acelerar a alteração das rochas e formação do solo no campus, devido a penetração das raízes no substrato, que facilita a percolação das águas superficiais. Durante a construção da cidade universitária, muito material de solo foi remobilizado para aterrar/planificar parte do terreno. A área original do campus pertencia a uma antiga fazenda, em parte alagada, o que demandou a configuração de um sistema de drenagem. O canal do Tejo na área da Escola Politécnica foi construído para ajudar a escoar a água presente nas camadas sedimentares. A área da raia foi uma cava de extração de areia utilizada na construção do campus. Ao fim das obras, a raia foi naturalmente preenchida pelas águas da chuva.

Perfil esquemático do poço perfurado entre o IGc e a FAU, com a variação das camadas de rocha sedimentar e ígnea até a profundidade de 300 metros.   

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